Entre Palavras

sexta-feira, 4 de abril de 2008

É preciso estarmos mais distraídos...



Escolhi essa imagem, pois ela me faz pensar sobre como duas pessoas podem fazer bem uma a outra. Ela é de um filme de 1999 chamado The History Of Us que narra a história de um casal que se vê emocionalmente esgotado após 15 anos de casamento e os questionamentos feitos por eles sobre o que é que afinal constituía o "nós" e o porquê das características que outrora fizeram com que eles se apaixonassem serem justamente os motivos centrais para a criação de um buraco cada vez maior entre eles. Enfim, a quem essa temática interessa... é um filme que eu recomendo, devido a sua tentativa de mostrar, de uma forma mais "real", alguns dos conflitos de um relacionamento de tantos anos.
E quanto aos diversos questionamentos feitos por eles e no meio de tantas cobranças tão rígidas só me veio na mente as seguintes palavras de Clarice Lispector:
“Havia a levíssima embriaguez de andarem juntos, a alegria como quando se sente a garganta um pouco seca e se vê que por admiração se estava de boca entreaberta: eles respiravam de antemão o ar que estava à frente, e ter esta sede era a própria água deles. Andavam por ruas e ruas falando e rindo, falavam e riam para dar matéria peso à levíssima embriaguez que era a alegria da sede deles. Por causa de carros e pessoas, às vezes eles se tocavam, e ao toque - a sede é a graça, mas as águas são uma beleza de escuras - e ao toque brilhava o brilho da água deles, a boca ficando um pouco mais seca de admiração. Como eles admiravam estarem juntos! Até que tudo se transformou em não. Tudo se transformou em não quando eles quiseram essa mesma alegria deles. Então a grande dança dos erros. O cerimonial das palavras desacertadas. Ele procurava e não via, ela não via que ele não vira, ela que, estava ali, no entanto. No entanto ele que estava ali. Tudo errou, e havia a grande poeira das ruas, e quanto mais erravam, mais com aspereza queriam, sem um sorriso. Tudo só porque tinham prestado atenção, só porque não estavam bastante distraídos. Só porque, de súbito exigentes e duros, quiseram ter o que já tinham. Tudo porque quiseram dar um nome; porque quiseram ser, eles que eram. Foram então aprender que, não se estando distraído, o telefone não toca, e é preciso sair de casa para que a carta chegue, e quando o telefone finalmente toca, o deserto da espera já cortou os fios. Tudo, tudo por não estarem mais distraídos.”
E assim, percebo que é necessário estar um tanto ( e porque não muito?) desatento para que o amor tenha espaço para advir! Que se observe o quanto se cobra do outro e de si mesmo para que tais cobranças não sejam intensas ao ponto de sufocar aquilo que poderia florescer majestosamente, que não sejamos tão perfeccionistas ao ponto de nos perdermos (como muitos o fazem) nessa nossa eterna ânsia de uma completude plena, ilusória, na qual se pode acabar colocando um mundo de possibilidades a perder.
posted by Natália L. at 02:25

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